Ocupação, produção e resistência: terras quilombolas e o lento caminho das titulações

Autores

DOI:

https://doi.org/10.20435/inter.v23i4.3520

Palavras-chave:

escravismo, quilombos, titulação de terras

Resumo

As comunidades quilombolas contemporâneas, grupos de luta e resistência negra ao modelo escravagista e opressor instaurado no Brasil colônia, tendo o território como base da reprodução física, social, econômica e cultural da coletividade, que se mantém vivo como uma herança de diáspora, conquistaram, a partir da Constituição Federal de 1988, o direito à titularidade de suas terras. Estes espaços de organização do povo negro padecem de um grave problema: seus direitos constitucionais não estão sendo garantidos na prática. A morosidade dos processos de titulação de terras e a omissão do Estado são evidentes e colocam a vida e a cultura das comunidades quilombolas em risco. No entanto, os quilombolas necessitam do reconhecimento oficial de suas terras para alcançarem uma melhor qualidade de vida e acesso a políticas públicas. Nesse contexto, o presente artigo objetiva debater acerca do direito às terras tradicionalmente ocupadas e os porquês da lentidão do processo de titulação de terras no Brasil. Para a formulação do presente trabalho, realizamos uma pesquisa bibliográfica, de cunho qualitativo, buscando os principais autores que discorreram sobre o tema do escravismo, da formação histórica dos quilombos e das dificuldades atuais dessas comunidades tradicionais. Portanto, apesar de a Constituição Federal de 1988 assegurar, no artigo 68, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o direito dos quilombolas à propriedade de suas terras, o processo de regularização e implementação de titulação de terras no Brasil ainda não se concretizou.

 

Biografia do Autor

Márcia de Almeida, Mestranda PPGPP/UFPI

Mestra em Políticas Públicas pela Universidade Estadual do Piauí (UFPI). Especialista em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Osvaldo Cruz; em Fundamentos de Educação Especial − Área Políticas Públicas e Educação Especial pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS); em Estratégia de Saúde da Família  pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP-SP); e Docência do Ensino Superior pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI). Graduada em Serviço Social pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), e Bacharela em Direito pela UFPI. Servidora Pública Municipal da Secretaria Municipal de Saúde de Piripiri, PI. Servidora Pública Estadual na Secretaria de Saúde do Estado do Piauí (SESAPI). Atualmente é assistente social do Centro de Atenção Psicossocial – CAPS II – em Piripiri-PI.

Elaine Ferreira do Nascimento, Universidade Federal do Piauí - UFPI

Doutora e mestra em Ciências pelo Instituto Fernandes Figueira/Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Pesquisadora e Coordenadora Adjunta da Fiocruz Piauí. Tem experiência em pesquisa na área de Saúde Pública, com ênfase em Ciências Sociais Aplicadas.

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Publicado

2022-12-22

Como Citar

de Almeida, M., & Nascimento, E. F. do. (2022). Ocupação, produção e resistência: terras quilombolas e o lento caminho das titulações. Interações (Campo Grande), 23(4), 945–958. https://doi.org/10.20435/inter.v23i4.3520